sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Virando o barco

É só mais uma folha do calendário,
só mais um um dia, um mês, uma semana.
Apenas uma data a mais.
Outro ano, os meses se repetindo.

Vou ver o mar, conversar com Iemanjá,
vou pedir meu presente de novo,
o que se dá, não se tira.
Não pode deixar meu barco a deriva.

Feliz ano novo! Adeus ano velho!
Vou te fazer novo, não só uma data.
Vou me fazer feliz, não só hoje.
Outro ano, os meses se renovando.

Vou brindar com a Mãe das Águas,
beber da força da natureza, beijar as ondas do mar.
Vou lavar a alma com sal, esquecer o coração na areia.
Outro ano, os meses não contam mais.

Por que tenho a impressão que na espuma
onde perdi meus brincos, também deixei as mágoas.
Por que a sereia me acena, me encanta,
e devolve, em conchas, o meu pedido.

A maré sobe e chove.
A escuridão envolve meu barco que balança mas não vira.
Navega incerto e temeroso, vai em frente e some no futuro.
Outro ano, os meses a transbordar!
Lucia D'Acri

sábado, 18 de dezembro de 2010

Ah!

A vida é um susto.
Um susto atrás do outro.
E eu, assustada, vivo.
Lucia D' Acri

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

No céu

Ele, sua metade coração, levantou vôo.
Ela então, sentindo a alma leve, correu a soltar pipas.
...
só queria ficar mais perto.
Lucia D'Acri

sábado, 20 de novembro de 2010

Visitante

Ele chegou de repente.
Sentou-se no sofá e me sorriu, cínico.
Na cozinha, invadiu a geladeira.
E depois deitou-se na minha cama.

Me agarra pelos cabelos,
Beija minha boca com fome
Alisa meu corpo,
sem nenhum escrúpulo.

E lambe minhas orelhas,
e sussura nos meus ouvidos.
E não me diz nada - não é preciso.
Sua presença é plena.

Abro a porta e o convido a sair,
mas com um olhar cruel
ele se nega e me envolve.
Silêncio - ele é todo e só.
Só silêncio.
Lucia  D'Acri

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Sempre há alguém

Todo dia antes de levantar, separo cinco minutos.
Cinco minutos em que eu penso em alguém, alguém que um dia passou pela minha vida e agradeço.

Agradeço por uma gentileza, por um sorriso, por um carinho.
E cada dia descubro mais pessoas, tantas gentileza, sorrisos e carinhos.

Algumas pessoas passaram tão rapidamente que quase não me dei conta.
Outras estão grudadas na minha pele para sempre.
Há aquelas que perfumaram meu caminho e outras que me foram atalho.
Todas, de um jeito ou outro, me fizeram feliz em algum momento.

Todas me ajudaram, até mesmo sem o saber.
E não há distinção aqui. Penso naqueles que, com pequenos gestos ou atos, foram meus amigos.
E também em outros que, durante toda a vida, estiveram comigo.
Poucos, é verdade, ainda permanecem no meu dia a dia, pelas circunstâncias da vida ou por que, simplesmente, nos perdemos.
Mesmo lamentando, agora entendo que é assim - não podemos ter todas as pessoas que um dia entraram na nossa rota de viver.

E são tantas! Falo aqui de coisas imensas e pequenos atos como sujeito que um dia não cobrou o lanche por que sabia que eu não tinha como pagar e só assim eu consegui fazer uma prova importante. Do outro que me indicou para uma vaga que sequer sabia seria o meu melhor emprego. Da amiga que me resgatou em uma noite de ano novo e me fez ver que o futuro ainda estava por vir. Falo do senhor que sequer sabia meu nome e me ajudou a resolver um grande problema.

Falo do porteiro solícito, do sapateiro honesto, do cartão de natal agradecido, do elogio inesperado. E falo também de quem me colocou no colo, segurou minhas barras e de quem me ligou no meio da madrugada por que sabia que eu, insone, amargava de tristeza e solidão.

E então eu vejo que cinco minutos não são bastantes. Eu precisaria de uma outra vida para agradecer a todos. E me dou conta de que é hora de levantar e me levanto feliz.

sábado, 30 de outubro de 2010

Castigos

Nem a morte nem o inferno.
Os piores castigos são a paixão que acaba e o corpo que envelhece.
Lucia D'Acri

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

E ninguém me disse nada

Não corra, não fume, não beba, Nunca fale com estranhos.
Tenha cuidado e olhe para os lados ao atravessar a rua.
Não chore.
Quantos conselhos vãos.
Não, não me disseram que a vida é um susto.
Não me falaram que eu precisava correr pois a vida é curta.
Não, não me disseram que os maiores prazeres são proibidos
e que a fumaça do cigarro esconde mil segredos.
Não, não me disseram que devia, avidamente, beber a seiva da vida que evapora rápido.
E ninguém, absolutamente ninguém me disse:
Faça de estranhos seus amigos e corra entre os carros atrás do que realmente vale a pena.
E no fim ainda não querem que eu chore?
Lucia D'Acri

sábado, 2 de outubro de 2010

Rodo e rodo,
sento, levanto, sento.
Nada prende minha atenção,
Nada consigo fazer.

Pois só faço pensar.
Pensar no que dizer,
Pensar no que fazer,
Ou não fazer.

Rodo e rodo,
sento, levanto, sento.
Só você prende a minha atenção,
E nada há a fazer. Cadê você?
Lucia D'Acri

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Vespeiro

Neste momento me sinto como criança
que mexeu no vespeiro.

Neste momento me sinto adolescente
que foi a festa escondida.

Neste momento me sinto prisioneira
que tenta fugir no meio da noite.

Mas as abelhas prometem mel.
A festa parece ser boa
E a noite... ah, a noite esconde tanto!

Lucia D'Acri

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Logo agora
quando minha alma
aquietava.

Logo agora
quando tudo
se acomodava.

Logo agora
quando eu
não sonhava.

Logo agora
que a solidão
me acompanhava.

Logo agora
você chega, estranho e estrangeiro,
e acorda meu coração.

Logo agora
quando com medo, pergunto
Logo agora?

Lucia D'Acri

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

E repente olhei-me no espelho.
Não mais o rosto infantil,
Não mais o sorriso.
Sumira todo o brilho.

Então percebi.
A embaçada imagem refletida
não era eu.
Era a Esperança, deusa de olhos verdes,
agora tão esmaecidos.

Atrevi-me a perguntar:
Existe alguém mais infeliz do que eu?
E o reflexo então me respondeu:
Infeliz? Não. Só estás triste.
Triste - como só os amantes conseguem ser.
Lucia D'Acri

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

As vezes parece que a dor se foi.
Mas é só um momento.
Ela foi na esquina, fez a curva e voltou.
Entrou e bateu a porta.
Sentou-se no sofá e me olha com seus olhos tristes.
E aqui dentro dói. De novo.
Lucia D'Acri

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Pensamento do Dia:

Do viver e das meias

Não há como viver eternamente em festa. Não há como alienar-se de tudo e não há como não entediar-se.
Pensando bem, não há, verdadeiramente, sentido em nada, muito menos em em dobrar meias, mas a vida exige: há que se dobrar meias.
Lucia D'Acri

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

O rejeitado é patético.
E ser patético é triste.
Patético e triste é o amor rejeitado.
A gente devia desapaixonar ao mesmo tempo que o outro.
Mas isso não acontece.

O rejeitado é patético.
E ser patético é humilhante.
Patético e humilhante é o amor rejeitado.
A gente devia virar a página e seguir rapidamente.
Mas isso não acontece.

O rejeitado é patético.
Como é patético esse poema.
Mas não há poesia no amor rejeitado.
Então é preciso desapaixonar, virar a página.
E isso, às vezes, acontece... Mesmo sendo patético.
Lucia D'Acri

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Versos que não deviam existir

Olham os poetas as crianças das vielas
mas não pedem cançonetas mas não pedem baladas
o que elas pedem é que gritemos por elas
as crianças sem livros sem ternura sem janelas
as crianças dos versos que são como pedradas.”
Sidónio Muralha

Belo poema que não devia existir. Por que não devia existir criança sofrendo, não devia existir criança desemparada; por que pais e governo irresponsáveis não deviam existir.

sábado, 19 de junho de 2010

Começar de novo

A cada dia, a cada momento.
Todo movimento é sempre um começar.
De novo, outra vez, novamente.
Tudo igual e, ao mesmo tempo, tão diferente.
Lucia D'Acri